Sócrates corrompeu a juventude ateniense?

O processo movido contra Sócrates se fundamentou na acusação de corrupção da juventude ateniense e de culto a deuses estrangeiros. É verdade que Sócrates não poupava a maioria de seus interlocutores quando os surpreendia defendendo opiniões infundadas. Mas será justo acusá-lo de corromper a juventude? Segundo a opinião de F. M. Cornford, a resposta é: sim e não.

“Não é de surpreender que os cidadãos mais velhos de Atenas, quando souberam (talvez por meio de desagradáveis conversas com seus próprios filhos adolescentes) que Sócrates incentivava os jovens a questionar todo preceito moral, não viram nenhuma diferença entre sua doutrina e a de Antifonte, concluindo que ele estava corrompendo os jovens. Se tomarmos nossa palavra ‘corromper’ em seu sentido literal, a acusação era verdadeira. Dizer aos jovens que, para obter a total liberdade da idade adulta, eles devem questionar toda máxima de conduta que receberam e julgar toda questão moral por si mesmos significa corrompê-los no sentido de destruir toda a muralha com que os pais e a sociedade, de maneira tão laboriosa, cercaram-lhes a infância. Na verdade, Sócrates estava minando a moralidade da submissão social — aquela moralidade da obediência à autoridade e da concordância com o costume, que tem mantido coesos os grupos humanos de todos os tamanhos, da família à nação, ao longo de toda a história da humanidade. Ou melhor, ele estava indo além desta moralidade de submissão e proibição para uma moralidade de tipo diferente, da mesma forma que o Sermão da Montanha vai além da lei oferecida no Sinai. O surgimento desta nova moralidade está dentro da própria alma. Pode ser chamada de moralidade da aspiração à perfeição espiritual. Se a perfeição espiritual for vista como o objeto da vida e o segredo da felicidade, então a ação não pode ser governada por nenhum código de regras exposto do exterior. Se essas regras são válidas em algum caso real, é uma questão que só pode ser decidida pelo veredicto sincero e desinteressado da alma individual”.

(F. M. Cornford, Antes e Depois de Sócrates, Martins Fontes Editora, p. 43-4).

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