Para estudar de verdade, é preciso que você queira de verdade

O intelectual é um consagrado: é com essa assertiva que o Sertillanges começa o primeiro capítulo de seu livro “A Vida Intelectual”. Mas quem é o intelectual? Intelectual é aquele que pretende direcionar o olhar de seu espírito para o alto, encontrar as causas primeiras e, se possível, busca propagar o conhecimento da verdade e do bem entre aqueles que estão ao seu alcance.

O intelectual deve desenvolver seu próprio espírito a fim de ter um contato pessoal com o Verbo Divino. Essa prática lhe dará acesso ao santuário admirável do conhecimento. O estudioso pode se dedicar aos estudos em tempo integral ou pode ter uma profissão que lhe dê o sustento. O importante é ter uma dedicação profunda e séria. Só àqueles que se dedicam de coração a verdade se entrega; a verdade só se entrega a quem se faz escravo dela.

Antes de entrar na vida intelectual é necessário avaliar nossas reservas. A entrada nessa vida deve ser objeto de meditação consigo próprio. Alguma afinidade pode contar nesse particular. Sim, porque o prazer de estudar pode ser um indicativo de que existe aí uma vocação — segundo Santo Tomás de Aquino o prazer qualifica as funções.

Não tenha pressa: o gênio é fruto de uma longa paciência. Ademais, não pense em desistir por não ter uma inteligência extraordinária: para ingressar em uma vida de estudos basta uma inteligência um pouco acima da média e, sobretudo, perseverança — é essa quem dinamizará o trabalho. Ter energia e saber aplicá-la bem: esse é o segredo da vida intelectual.

Ter todo o tempo livre para os estudos pode ser uma armadilha. Para a maior parte das pessoas é importante ter uma atividade que lhe tomará boa parte de seu tempo. Nesse caso, o estudante deverá separar algumas poucas horas diárias para a atividade de estudos — e deverá defendê-las com algum grau de egoísmo (bem compreendido).

Não é necessário que você conviva com grandes mentes — embora isso possa, em alguns casos, ser de vital importância. Mas é essencial que você queira muito e que saiba manter a vontade viva. O mero desejo é passageiro. É preciso ter uma vontade real de buscar o conhecimento e de integrá-lo em sua vida.

Uma relativa solidão é importante para a vida de estudos. É no silêncio que você entrará em contato com a Inteligência Divina. A solidão vivifica, mas, vejam, o isolamento esteriliza e paralisa.

Toda verdade pode ter aplicação prática e, sem dúvida, toda verdade tem uma função redentora. O intelectual precisa estar atento a pessoas e a grupos e verificar se e como ele pode ajudá-los a sair das trevas. Em tempos de crise, o intelectual tem uma missão de resgate.

Então, o intelectual não é um isolado. Porém, devagar com o andor. Esse é um longo caminho. Ao estudante cabe estudar. Ao intelectual em formação ou ao intelectual já consumado cabe, se for o caso, interferir no curso dos acontecimentos. Atente, porém: o intelectual deve sempre ter diante de si suas próprias falhas: o maior pecado do mundo é o nosso. Antes de corrigir implacavelmente os outros não custa passar a vista em nossas próprias condutas.

O intelectual é um homem de seu tempo. Como entender isso? É que o intelectual tem um compromisso com as angústias de seu tempo. Por um lado, é essencial que o intelectual compreenda o passado, conheça e saiba com profundidade a história do conhecimento. Mas, por outro lado, você nasceu neste tempo e — se há algo que você possa fazer — é aqui, neste contexto, que sua ação é esperada.

(Este texto é o segundo comentário — de um total de vinte e cinco — ao livro “A Vida Intelectual”, de A.-D. Sertillanges.)

Assista ao vídeo:

https://www.youtube.com/watch?v=Yqq6INpmhU0

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