Aqueles pedaços de pano pendurados…

Numa certa época, eu evitava comprar em lojas especializadas em ternos para gente que vai na formatura de parente. Não me caíam bem. Por outro lado, não tinha dinheiro suficiente para entrar em lojas de grife. Por isso dei graças a Deus quando conheci um alfaiate em Belo Horizonte, um senhor experiente e muito caprichoso, que fez praticamente todos os ternos que usei nos primeiros anos da Promotoria de Justiça.

Esse alfaiate só tinha um defeito (grave defeito): ele nunca cumpria prazos. O pobre coitado tinha problema com alcoolismo. Isso imprimia no seu trabalho um ritmo muito próprio — não porque fosse preguiçoso, mas porque, profundo conhecedor de sua própria alma, sabia que não podia ter muito dinheiro no bolso (no caminho da oficina há um bar em cada esquina). Assim, as paredes de sua salinha de trabalho eram compostas pelas encomendas que ele ia estrategicamente acumulando como quem empenha um patrimônio no banco. A impressão que tenho hoje é a de que ele ia concluindo as peças na medida (e somente na medida) em que precisava do dinheiro para suas necessidades básicas.

No tempo em que eu fui seu cliente, as paredes de sua sala sempre tinham um ou dois ternos meus, em fase de costura, e outras tantas peças de outros tantos clientes mais ou menos impacientes como eu. Aqueles pedaços de pano pendurados em pregos (pregos velhos, da época de seu pai, de quem herdou o ofício) davam-lhe segurança em relação ao futuro; e lhe lembravam que a sua vida só podia ser vivida com a disciplina rígida dos monges.

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